Sob a pressão de governos, consumidores e da sociedade em geral, muitas empresas de consumo começaram a repensar as embalagens de seus produtos como uma forma para atingir metas de circularidade e reduzir as emissões de gases de efeito estufa. No caminho, têm enfrentado desafios, como sistemas de reciclagem e gestão de resíduos ainda imaturos, variações de legislação e a imprevisibilidade da aceitação dos consumidores.
De acordo com uma pesquisa da Bain, apenas 7% das empresas têm alcançado sucesso na circularidade de embalagens – metade da taxa de outras transformações. Outra descoberta decepcionante: 80% das empresas que começaram há menos de um ano relatam que seu programa de sustentabilidade não está no caminho certo. Como 45% das emissões mundiais vêm da fabricação e consumo de produtos, e todas as dez maiores empresas poluidoras de plástico do mundo estão na indústria de produtos de consumo, é preciso virar esse jogo.
Desafios para práticas de reciclagem
Com base em diversos estudos, a Bain reuniu os quatro principais fundamentos que interferem no sucesso das práticas de reciclagem:
Legislação: os países estão em estágios muito diferentes da evolução da legislação sobre resíduos. Em geral, a UE está mais adiantada, mas a China e alguns estados pioneiros dos EUA já começaram a implementar uma agenda robusta, que tem aumentado suas taxas de reciclagem. No Brasil, 77% da população espera que a legislação seja mais rigorosa com as empresas no que se refere às iniciativas de sustentabilidade. Atualmente, é exigido que pelo menos 22% das embalagens sejam recicladas, porém não há discriminação de materiais. Isso dificulta a criação de incentivos para a reciclagem de insumos que não sejam o papelão e o alumínio.
Infraestrutura: a infraestrutura de gestão de resíduos para produtos embalados varia de acordo com o país e abrange a fabricação, descarte pós-consumo, coleta/triagem e reciclagem/descarte. O Reino Unido e a UE alcançaram altas taxas de coleta formal, triagem e reciclagem dos materiais mais importantes, enquanto que Brasil e China apresentam baixas taxas de coleta e triagem formal, possibilitada por vários participantes pequenos e principalmente informais.
Tecnologia: inovações tecnológicas podem minimizar a geração de resíduos, melhorar a descarbonização e a gestão de resíduos inevitáveis. Reciclagem e substituição por vidro, metal e papel reciclados são as soluções com maior probabilidade de crescimento até 2030. Outra aliada será a reciclagem mecânica, que vem se tornando mais eficaz e deve ser a tecnologia dominante até 2030. A tecnologia também pode ser implementada para separar os resíduos, como as estações de separação de materiais secundários (MRFs), que ainda são apenas duas na América Latina, e estão em funcionamento em São Paulo.
Consumidor e varejistas: os consumidores estão cada vez mais conscientes dos desafios da sustentabilidade e dizem que estão mais dispostos a agir. No entanto, existem questões importantes que impedem a mudança de comportamento do consumidor. Embora a conscientização esteja aumentando, muitos clientes ainda não estão totalmente confiantes em sua capacidade de mudar seu comportamento. Isso acontece em grande parte pela conveniência, uma vez que a adoção de práticas mais sustentáveis exige maior esforço dos consumidores. Outro fator a considerar é que diferentes segmentos de consumidores tendem a se envolver em níveis diferenciados. Enquanto cerca de 40% dos consumidores relatam que se preocupam com o planeta na Europa e nos EUA, apenas 14% dos consumidores europeus e 8% dos consumidores dos norte-americanos consideram questões ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG) como critérios de compra.
Cenários prováveis para as embalagens
A Bain aponta três cenários plausíveis sobre como as embalagens sustentáveis de bens de consumo poderiam ser em 2030 nos mercados dos EUA, Reino Unido/UE, China e Brasil:
uma economia em que os avanços no comportamento do consumidor levarão a uma mudança para materiais alternativos e apresentação de novos produtos (neste cenário, as empresas não devem depender muito da reciclagem);
um avanço na circularidade trazido por evolução principalmente em legislação, infraestrutura e tecnologia, levando ao desenvolvimento da indústria de reciclagem;
uma mudança verde na qual os avanços em todos os quatro fundamentos reduzem a demanda de materiais e remodelam a cadeia de valor para um fluxo circular.
Embalagens circuláveis
A transformação sustentável de embalagens é uma agenda complexa. Como em qualquer outra transformação estratégica, o envolvimento da alta administração é fundamental para definir as prioridades, alocar recursos, promover mudanças comportamentais e engajar todas as partes interessadas na jornada.
Executivos de bens de consumo veem a oportunidade de transformar as embalagens como uma forma de avançar em direção às suas metas de circularidade e reduzir as emissões. Eles reconhecem que há muito em jogo, porém, se traçarem caminho por meio da adoção de uma abordagem sistemática, poderão dar os maiores saltos em direção a um futuro sustentável.