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Entrevista: Caio Camargo aponta tendências do varejo 2020

O varejo é um dos setores mais dinâmicos da economia. Apesar das dificuldades enfrentadas na atual crise, o segmento tem mostrado uma discreta recuperação nos últimos meses. Mas o ano está acabando e é momento de olhar para o futuro para projetar melhores resultados.

Pensando nisso, quais são as tendências que vão impactar o varejo em 2020? Para responder a essa pergunta, a equipe do Portal de Notícias GS1 Brasil conversou com Caio Camargo, sócio-diretor da GS&UP, unidade de negócios do Grupo Gouvêa de Souza focada no desenvolvimento de negócios para startups nas áreas de varejo e consumo.

Caio Camargo é um apaixonado por tecnologia e pelo universo do varejo. Arquiteto de formação, palestrante, professor e empreendedor, ele criou o site Falando de Varejo, no ar desde 2008. Autor do livro Arroz, Feijão & Varejo, Caio tem milhares de seguidores nas principais redes sociais.

Para ele, os varejistas precisam colocar no radar a automação das lojas e a chegada de novos meios de pagamento. Porém, ainda é preciso muita atenção com a gestão dos negócios e o atendimento ao cliente, questões que podem ser otimizadas com a ajuda das startups.

Confira a entrevista.

Na sua opinião, o varejo brasileiro é inovador?

Ainda não. Costumo brincar que há muito tempo o varejo faz a mesma coisa: comprar bem comprado e vender bem vendido. A inovação ainda é um assunto distante,parece que é uma escada gigantesca para subir. Mas a inovação  pode ser feita em pequenas doses e o varejista pode ir avançando degrau por degrau até atingir a escada completa.

Qual é a sua análise do cenário atual de adoção de tecnologia pelo varejo?

Tem muita coisa bacana a ser explorada. Mas, primeiro ponto: vamos sair do Excel e buscar uma gestão melhor e compartilhada, ter processos melhores. Muitas empresas hoje são regidas na base do Excel, enquanto há uma série de oportunidades acontecendo com startups, com softwares. O varejista precisa controlar a empresa, não importa o tamanho dela, com números e não com subjetividade. Não é ‘eu acho que’, mas ‘eu sei que’. É preciso saber quanto vende, quanto deixou de vender, qual o tamanho do estoque, qual a ruptura. Tem gente que até hoje abre a porta da loja, toca a loja o dia inteiro, fecha a porta da loja e pergunta ‘quanto deu de venda hoje?’. Isso não é gestão, é resultado, já passou. O que você pode fazer proativamente pelo seu negócio? Só vai conseguir ser proativo com números.

Quais são os desafios para o varejo inovar?

Em primeiro lugar, a cultura. Há 21 anos trabalho com varejo e, lá atrás, aprendi que o principal ativo do varejista era a expertise dele, o conhecimento que só ele tinha sobre como fazer negócios, era o cara bom. No passado, isso fez dele um vencedor em uma série de crises, quando as crises eram apenas econômicas. Acontece que não estamos passando apenas por uma crise econômica, mas uma crise econômica junto com uma revolução digital e com um novo modelo de consumidor. Isso tudo somado fez com que a expertise do varejista envelhecesse muito rápido. O fato é que ele ficou tão preso no que deu certo, que não percebeu o quão distante do mercado ele está hoje. É isso que a gente precisa tentar quebrar. Essa expertise precisa ser maleável para o varejista ser mais aberto à inovação.

Quais são as tendências para 2020 para o setor de varejo?

Muitas coisas estão para acontecer, mas três pontos são mais fortes. O primeiro é que, em 2020, vamos ver a automação de lojas. Neste último ano, discutimos sobre a revolução que a Amazon Go está causando. Em janeiro de 2018 na NRF, em Nova Iorque, levantamos mais de 15 empresas que estavam se propondo a fazer modelos de lojas automatizadas. E começamos a ver isso no Brasil também, como a Zaitt, em São Paulo. Em 2020, vamos ver uma proliferação maior desse número de lojas autônomas, que não precisam de vendedores. Também tem crescido o número de lojas que utilizam self checkout, em que não é necessário um operador de caixa. Tenho acompanhado cases de farmácias e supermercados e 80% das compras têm passado por esse modelo de self checkout, indicando que o consumidor quer esse meio digital e automatizado. O segundo ponto está relacionado aos meios de pagamento. Não se sabe como, nem quando, nem quem, mas a maneira como o consumidor faz seus pagamentos vai mudar – pode ser maquininha, celular, QR Code ou um super aplicativo. Está muito difícil dimensionar como vai acontecer essa história, se terá influência do que acontece na China, se será algo como WhatsApp ou PayPal, mas de fato algo vai mudar. E, terceiro, é a Inteligência Artificial, que parece algo surreal quando falamos de varejo, mas vai acontecer de forma dinâmica. Temos observado que a Inteligência Artificial vai vir para responder questões de gestão que antes não eram muito percebidas. Por exemplo: antes era possível fazer previsão com Inteligência Artificial, como o ritmo de compras para dimensionar estoque. Agora, vemos que a Inteligência Artificial vai chegar não só pelas empresas de tecnologia, mas também pelas startups com soluções que podem, por exemplo, sugerir o seguinte: se a loja comprar de determinado jeito, poderia faturar X% a mais. Essa inteligência começa a chegar no mercado e tem tudo para dar certo em 2020.

Falando em startups, elas estão com toda a força trazendo inovação para o mercado. De que forma elas  impactam o varejo?

Startup é o caminho mais curto, mais barato e mais interessante para o varejista se aproximar de inovação, que parecia um assunto tão distante para ele. Inovação é uma corrida muito difícil, parece que é só para empresa grande, que é coisa do futuro. Mas não é. Inovação é acompanhar minimamente o seu mercado. E as startups são criadas, normalmente, para resolver uma dor do varejo. Costumo dizer que as startups de varejo estão orientadas para três funções: ajudar a aumentar a venda, melhorar processo ou reduzir custo. Se elas não ajudarem nesses três pontos talvez não valha a pena. Mas o fato é que as soluções das startups têm custo baixo, porque elas têm processos de SaaS [software as a service] que o varejista pode, por exemplo, contratar durante um mês e, se não quiser mais, cancelar no mês seguinte. Então é muito fácil. Hoje, no Brasil, existem mais de 13 mil startups, mais de 75% delas voltadas para o B2B. Dificilmente vai ter uma dor do varejista que já não tenha uma startup correndo atrás disso para ele.

Como o varejo pode se aproximar do ecossistema das startups para acelerar a inovação?

Há muitas oportunidades e o varejista precisa se aproximar desse ecossistema de startups para buscar a melhor solução de acordo com o que ele precisa. Existe uma série de espaços onde os varejistas podem encontrar essas startups, tem o inovabra, o Cubo, Associação Brasileira de Startups, as aceleradoras, que podem ser encontradas com uma simples busca no Google ou a leitura de publicações do mercado dá boas pistas de onde ele pode começar a se conectar com as startups hoje.

“Startup é o caminho mais curto, mais barato e mais interessante para o varejista se aproximar de inovação”

O consumidor deseja cada vez praticidade e a tecnologia ajuda muito nesse aspecto, com apps e novidades tecnológicas aliadas à experiência de compra. Porém, ele também quer algo mais humanizado e personalizado. Como o varejo pode equilibrar esses dois aspectos?

A gente ouve muitos jargões no mercado, como Varejo 2.0, 3.0 e, 4.0, mas eu falo que está difícil achar o 0.5, ou seja, o varejo que faz o básico bem feito. Antes de inventar muita coisa, precisamos fazer o básico bem-feito. O atendimento, antes de ser personalizado, precisa ser um bom atendimento. Existe uma série de ferramentas que permitem ter informações e histórico de compras do consumidor para que a loja possa oferecer um atendimento melhor. Mas o atendimento ainda é uma relação pessoa a pessoa. Um bom vendedor, um bom atendente de loja consegue olhar nos olhos do consumidor e entender o que ele precisa e personalizar, na conversa – não precisa de sistema nem de mágica –, esse atendimento. Existem sistemas para ajudar o varejista, mas é importante fazer o básico, que é atender bem.

Foto: Divulgação Grupo Gouvêa de Souza

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