A Indústria 4.0 representa uma disrupção nos negócios das empresas em todo o mundo. Em tempos de pandemia, este novo conceito tem apoiado o desenvolvimento de novas soluções na área da saúde. No entanto, para empresas que atuam em setores fortemente impactados pela crise têm sido um grande desafio em adotar ou dar continuidade aos projetos nessa área.
No Brasil, apesar do setor fabril discutir a Indústria 4.0 há algum tempo, na prática, ela ainda não é aplicada amplamente. Um levantamento da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), denominado “Indústria 2027”, indica que apenas 1,6% das 759 empresas brasileiras consultadas informou ter sistemas integrados, fábricas conectadas e processos inteligentes para subsidiar a tomada de decisão dos gestores.
A adoção de conceitos da Indústria 4.0 na matriz produtiva brasileira poderia gerar uma economia de R$ 73 bilhões ao ano, sendo R$ 35 bilhões em ganho de eficiência, R$ 31 bilhões na diminuição de gastos com a manutenção de máquinas, e R$ 7 bilhões de economia no consumo de energia, segundo estudo da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), divulgado em 2017.
Osvaldo Lahoz Maia, do SENAI-SP – Foto: Divulgação
O gerente de inovação e tecnologia do SENAI-SP, Osvaldo Lahoz Maia, conta que esse conceito nasceu na Alemanha, em 2011, quando o governo alemão, universidades, centros de pesquisas e empresas de tecnologia se uniram para criar essa estratégia robusta, também conhecida como Quarta Revolução Industrial.
Englobando automação e tecnologia da informação, além das principais inovações tecnológicas (Big Data, Inteligência Artificial, sistemas ciberfísicos, robótica, Internet das Coisas, etc), aos poucos a Indústria 4.0 passou a ser adotada por diversos setores e países.
“O objetivo não era deixar a fábrica mais bonitinha, cheia de robôs ou de lâmpadas. A ideia era aumentar a produtividade, trazer a possibilidade de customização e reduzir custos”, resume Maia.
Daniel Scuzzarello, da Siemens – Foto: Divulgação
Quando os conceitos e as tecnologias da Indústria 4.0 são bem implementados, é possível produzir com mais qualidade, rapidez e custos menores.
O diretor de portfólio da Siemens Digital Industries Software para América do Sul, Daniel Scuzzarello, reforça que a Indústria 4.0 se torna indispensável na medida em que os clientes exigem produtos cada vez mais personalizados.
“A digitalização é o grande elo entre a Terceira Revolução Industrial, que começa a colocar robôs na linha de produção; e a Quarta, quando começamos a digitalizar e conectar essas tecnologias com o desejo do cliente”, diz.
Outro grande benefício é previsão de cenários. “A Indústria 4.0 possibilita a análise preditiva. Com ela, é possível prever a parada de máquinas, o que é um grande benefício, já que a cada hora suspensa, os custos são altos numa fábrica. É possível, assim, antecipar que uma caldeira vai parar porque a temperatura está muito alta, por exemplo. Torna-se viável fazer mais com menos, reduzindo custos operacionais”, mostra Scuzzarello.
Com a pandemia, que afetou bruscamente os investimentos e o andamento dos negócios, as empresas devem seguir com os projetos de Indústria 4.0 ou pausá-los temporariamente?
Para os consultores ouvidos pela reportagem do Portal de Notícias da GS1 Brasil, cada companhia deve fazer uma análise do seu cenário.
“As empresas deveriam seguir os projetos de digitalização, mas agora o principal problema de algumas delas é a sobrevivência. Em primeiro lugar, é preciso cuidar da sobrevivência da companhia, pois o custo para esse investimento pode ser alto. Entretanto, constatamos que companhias que tiveram a cultura digital disseminada atravessam melhor os momentos de crise, ficando mais ágil, se adaptando mais rápido a qualquer realidade”, analisa Maia, do SENAI-SP.
Scuzzarello, da Siemens, também reforça o momento crítico pelo qual o mundo vive, tornando alguns investimentos secundários.
“Muitas empresas estão ‘espremendo’ suas contas para se manterem no mercado. Então os projetos ficaram em segundo plano. Mas quando se pede para que, de repente, uma empresa precise operar de forma remota, vemos muitas falhas que não poderiam acontecer, como acesso remoto aos sistemas. Assim, notamos que empresas estruturadas e digitalizadas estão muito mais preparadas para momentos como esse. É possível ‘virar a chave’ mais rápido, sem a necessidade de ficar por semanas pensando em entender os problemas”, diz Scuzzarello.
O papel dos líderes é fundamental. “Se os líderes da companhia não entenderem a importância desta transformação, dificilmente ela dará certo”, afirma Maia.
O projeto-piloto ajuda a provar que o conceito a ser adotado está correto, além de identificar falhas antes de implementá-lo.
“Esse tipo de estratégia, especialmente em relação a softwares, permite replicar soluções de modo mais fácil. Uma dica é sempre implementar as mudanças em processos curtos e ciclos menores”, sugere o executivo da Siemens.
Atualmente, os dados são o novo petróleo. “Ter dados confiáveis pode agregar muito valor ao negócio”, afirma Scuzzarello.
Por isso, a análise e a gestão de dados são pilares fundamentais para a adoção da Indústria 4.0. Ela permite, por exemplo, identificar onde estão os gaps tecnológicos.
“Às vezes se coleta muitos dados, mas não são todos analisados. Não adianta gerar sinal e sensores via Internet das Coisas (IoT), se não sabe processar”, adverte o gerente de inovação e tecnologia do SENAI-SP. Para essas atividades, as empresas precisam contar com profissionais qualificados, como analistas de dados.
Para ajudar a levar inovação e agilidade para o ambiente corporativo, essenciais para a Indústria 4.0, muitas indústrias estabelecem parcerias com universidades e startups.
“Na Siemens, estamos sempre próximos à universidades para conhecer novos talentos e mentes criativas, inclusive ajudando na formação dos engenheiros que precisaremos para daqui a quatro ou cinco anos”, diz Scuzzarello, acrescentando que além das universidades, as startups também podem ajudar nesse sentido. “Elas compartilham muitas boas ideias e têm muito a agregar”.
Contar com profissionais qualificados para essa transformação também é fundamental, porém nem sempre é fácil encontrá-los.
O ideal é que os profissionais tenham as hard skills, que são as habilidades técnicas, e as soft skills, as habilidades comportamentais, como resiliência, criatividade, empatia, entre outras.
Além disso, os colaboradores não podem parar de se atualizar. “Eles precisam estar atentos aos novos conceitos, como IoT, inteligência artificial, inteligência de dados, que serão temas muito latentes daqui pra frente”, aconselha Maia.
É preciso ser crítico o suficiente para entender onde a empresa pretende estar no futuro e quais mudanças serão necessárias para garantir o que foi planejado.
“Muitas empresas ainda trabalham com a mentalidade de que a digitalização não é necessária se os resultados ainda estão indo bem. Mas é preciso se preparar para competir no mundo. A digitalização é um tsunami e quem acha que vai conseguir surfar sem isso está errado”, alerta Scuzzarello, da Siemens.
Nesse sentido, é preciso fazer um diagnóstico, entendendo a dinâmica das operações, as dores do negócio e os gargalos tecnológicos, como sugere Maia, do SENAI-SP. “A partir daí se espera escolher um setor da empresa para testar e fazer um piloto, analisando aquela experiência e fazendo com que colaboradores e líderes enxerguem valor”.
Fotos: Getty Imagens
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