Mais do que uma metodologia ou uma ferramenta de gestão, o Lean é uma filosofia, com o objetivo de identificar, em qualquer processo produtivo, as atividades que agregam valor aos clientes e eliminar os desperdícios.
“A centralidade no cliente é algo fundamental para o Lean. O primeiro passo é reconhecer o que é valor e o que não faz diferença para o cliente e, depois, discutir formas de eliminar desperdícios para o sistema”, sintetiza o diretor do Lean Institute Brasil, Christopher G. Thompson, em entrevista ao Portal de Notícias GS1 Brasil.
O “pensamento Lean” parte do princípio de que todo processo produtivo está cheio de atividades que não agregam valor ao produto oferecido ao cliente.
Prega, portanto, a eliminação das atividades supérfluas, cortando assim custos desnecessários e gerando oportunidades de crescimento sólido e sustentado para a empresa.
Thompson fornece uma aplicação prática. “Quando pensamos uma lata de cerveja, por exemplo, a embalagem é desenvolvida para manter a temperatura do produto e, ao mesmo tempo, ter leveza e resistência, algo que é considerado valor para o cliente. Mas quando pensamos nos processos de envaze, matéria-prima e logística para lata chegar ao consumidor, pode-se ter muito retrabalho ou desperdícios, algo que não interessa ao cliente, mas pode ser crucial para a gestão da empresa. O Lean entra, justamente, mostrando o que é valor e onde estar as perdas”, afirma.
No Brasil, a filosofia Lean já é aplicada em diversos setores passando por grandes empresas ou startups.
“O Lean ganha força em momentos de crise, já que as pessoas estão dispostas a mudar nessas situações. E o Brasil é o País das crises. Portanto, temos nível de maturidade Lean entre os mais altos mundiais”, comenta Thompson, reforçando os benefícios desta filosofia.
“O Lean pode favorecer toda a sociedade. As empresas, com uma gestão mais efetiva e enxuta, se tornam mais competitivas; e o consumidor, na ponta, tem o seu valor atendido a um preço melhor. Gera-se um efeito positivo em cadeia”, pontua.
O Lean digital nada mais é do que a transformação digital por meio de um ponto de vista Lean
A transformação digital está acontecendo em todo o mercado e junto com este movimento está o cliente, que vem exigindo respostas mais rápidas, melhores e únicas em relação a produtos e serviços.
Na ânsia de responder as novas demandas de mercado, muitas empresas estão investindo em tecnologia.
“O Lean digital nada mais é do que a transformação digital por meio de um ponto de vista Lean. É comum muitas empresas se perderem nessa nova onda e acabarem gerando muito desperdício, trazendo ferramentas que não fazem sentido ou já querendo a ferramenta mais moderna. O Lean incentiva a entrega parcial de valor, mas contínua, e somente quando há demanda para tal”, comenta o CEO da empresa de gerenciamento de fluxo de trabalho Pipefy, Alessio Alionço.
“Não adianta ser o primeiro a implementar inteligência artificial para atender o cliente se não é nisso que ele enxerga valor. O pensamento com base no Lean ajuda a ver quais as melhores soluções”, acrescenta Thompson.
Hoje, existem diversas ferramentas que têm o Lean como base. O Kanban, por exemplo, que trabalha com a gestão visual dos processos, é um deles.
No mercado, surgem, ainda, outras soluções. “No Pipefy oferecemos uma plataforma tecnológica com soluções baseadas no Lean, customizável e capaz de empoderar as pessoas para que elas possam melhorar os processos por conta própria. Não precisa ser um mestre do Lean ou desenvolvedor para criar mudanças ou implementar etapas numa interface gráfica”, sugere Alionço.
Lean exige que se pense de uma forma não usual, e que as empresas saiam da zona de conforto
De modo geral, os conceitos do Lean já estão no DNA das pequenas empresas ou startups, que são formadas por poucas pessoas e que buscam entregar a melhor experiência pelo menor custo.
O maior desafio fica para as grandes ou para aquelas que vão crescendo, trazendo, consigo, burocracias e vícios que deixam a empresa incapaz de reagir às demandas e valores de seus clientes, conforme analisa Thompson. “Uma empresa ‘gorda’ tem dificuldade de se mover no mercado”.
Segundo Alionço, o Lean exige que se pense de uma forma não usual. “É preciso que líderes e colaboradores olhem para as coisas de forma diferente, tenham novas prioridades e ajam. Não se aprende o Lean lendo e estudando. Se aprende fazendo”, comenta, acrescentando que, quando se entra numa empresa, a maior parte dos processos conta com etapas que não agregam valor ou de baixo valor.
“As ineficiências são nítidas e há possibilidades de mudanças, mas é preciso ter amparo. É algo que precisa vir da alta gestão e ser incentivado por toda a equipe”, acrescenta.
Outro grande desafio é sair da zona de conforto. “Se já tenho tudo pronto, para que mudar?”, “Em time que tá ganhando não se mexe”.
Esse é o pensamento de muitos grandes empresários, segundo o diretor do Lean Institute.
Mas os imprevistos acontecem e as empresas precisam estar preparadas para eles. “O Covid-19, por exemplo, está tirando todo mundo da zona de conforto, quebrando modelos e criando respostas novas”, pondera.
Entender os conceitos do Lean também é essencial para ter bons resultados. “Usando incorretamente as ferramentas do Lean, na tentativa de cortar custos, pode-se cortar algo que é de valor ao cliente. Usando o exemplo da lata de cerveja, se entregar a embalagem usando plástico, por exemplo, por ser mais barato, pode-se ir contra as demandas do cliente. Nesse caso, corte-se o valor e não as ‘gorduras’”, conclui Thompson.
De acordo com o Lean Institute, o sistema de produção da montadora japonesa Toyota representa as raízes da filosofia Lean.
Com início no pós-segunda guerra mundial e o Japão devastado pelo conflito, a Toyota foi obrigada a reinventar o modo de produção, pois precisava produzir com diversidade, em pequena escala, com baixo custo para competir com as gigantes norte-americanas GM e Ford.
A Toyota, criou, então uma série de conceitos, técnicas e práticas de gestão que permitiam eliminar os desperdícios tradicionais dos processos produtivos, cortando custos e aumentando a eficiência.
Foi quando, nas décadas de 1980 e 1990, um grupo de pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos, fez uma grande pesquisa sobre a indústria automotiva mundial.
Tal estudo revelou ao mundo o Sistema Toyota, num livro lançado em 1990, chamado “A máquina que mudou o mundo”, que se tornou best-seller mundial ao iniciar a divulgação planetária das técnicas de produção da montadora Toyota, que se tornaram base para o Lean.
Foto: Getty Images
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