Fica cada vez mais claro que tanto o modelo atual do capitalismo, quanto o papel das empresas inseridas nesse conceito, estão mudando num ritmo acelerado.
Hoje, mais do que vender produtos, as companhias têm procurado melhorar o mundo em que operam, garantir equilíbrio ambiental e criar valor ao que oferecem ao mercado.
Nesse sentido, passam a ganhar força conceitos como o Marketing de Propósito e Marketing de Causa mas, antes de começar, é importante esclarecer as diferenças entre eles.
Em entrevista ao Portal de notícias da GS1 Brasil, o professor de marketing dos MBAs da FIA e fundador da agência Casa Darwin, Rodrigo Leão, afirma que existe uma grande confusão entre essas duas ações.
Marcus Nakagawa, da ESPM. Foto: divulgação
“O Marketing de Propósito acontece quando as ações de marketing estão alinhadas com a proposta de Criação de Valor Social da empresa. O Valor Social é o valor que a empresa cria para a além do lucro para acionistas e colaboradores”, esclarece.
Já o Marketing de Causa acontece quando uma marca impulsiona uma causa de relevância social que não está diretamente ligada ao seu propósito como negócio.
“Esse tipo de marketing acontece, por exemplo, quando uma empresa, junto com uma ONG ou causa, acaba levando valor agregado para os dois lados. O McDia Feliz, promovido pelo McDonalds, é um exemplo”, mostra o professor e coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental (CEDS), Marcus Nakagawa.
Rodrigo Leão, da FIA. Crédito: divulgação
O especialista da Fia fornece outros exemplos.
“A Natura é uma empresa que Cria Valor Social oferecendo cosméticos de alta qualidade produzidos a partir de ingredientes naturais de fontes renováveis, embalados e vendidos buscando o menor impacto ambiental possível. Todos os produtos da marca se beneficiam do Marketing de Propósito. Já a marca de salgadinhos Doritos, que Cria Valor Social oferecendo alimentos saborosos de baixo custo e valor nutritivo, próprios para o consumo momentos de diversão, lançou a linha Doritos Rainbow, que tem parte da receita doada para entidades que apoiam a causa LGBTQA+. Assim, faz Marketing de Causa”, mostra o especialista.
Durante a Covid-19, tem ganhado destaque o Marketing de Causa, uma vez que o Marketing de Propósito é uma ação continuada que engloba todos os aspectos e decisões de uma empresa expressando o Valor Social que ela cria continuamente.
“Durante a pandemia, algumas marcas de cerveja usaram suas fábricas para engarrafar álcool gel. Apoiaram, assim, a causa urgente da higiene coletiva para proteger a população. Mas em seu DNA, estas marcas não buscam criar Valor Social para além do lucro vendendo bebidas alcoólicas”, diferencia.
Esse tipo de marketing de potencializou pela Environmental, Social and Corporate Governance (ESG), em português, Governança Ambiental, Social e Corporativa, termo que surgiu em 2005, em um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), com o tema “Who Cares Wins” (“Ganha quem se importa”, em tradução livre).
“As pessoas, por conta da pandemia, começaram a entender que elas têm missão muito maior do que só vender produtos e serviços. Houve uma comoção para essa temática. As empresas têm, sim, de olhar para questões sociais, econômicas, ambientais e de governança. Consumidor, grandes investidores e fundos de investimento não estão falando mais só no lucro a qualquer custo e qualquer preço, mas que tenham parâmetros ligados a ESG, mas, sem, claro, perder a lucratividade”, sintetiza Marcus Nakagawa.
O Marketing de Propósito deveria ser visto como um objetivo para todas as empresas que desejam perdurar.
Porque para fazê-lo é necessário entender o Valor Social que o negócio gera no mercado.
“Muitas vezes, nesta análise, é possível enxergar que a empresa tem foco demais em captar valor e pouco em produzir valor. Mas toda empresa tem um propósito social e é fundamental entendê-lo com clareza. É essa visão que aponta para onde o futuro da empresa seguirá”, analisa Leão, citando um exemplo.
“As empresas que vendem agrotóxicos sofrem com uma má interpretação de seu propósito. O propósito destas empresas é oferecer soluções tecnológicas para o aumento da produtividade agrícola, que por sua vez permite haver comida de baixo custo para a população mundial. No presente, a solução oferecida é de defensivos agrícolas químicos que são muito nocivos para a saúde humana. Mas veja: se esta empresa seguir seu propósito, que é viabilizar agricultura de baixo custo e alta produtividade, pode buscar outras soluções como nano robótica, agroflorestas ou engenharia genética para atingir o mesmo fim”, mostra.
Além disso, esse tipo de visão passa a ser cada vez mais valorizado, seja por consumidores ou colaboradores de empresas.
“Pesquisas apontam que a geração Z não compra mais produtos de empresas envolvidas em escândalos. Assim como não querem comprar ou trabalhar em companhias assim. Essa geração está muito atenta para isso. Mas é preciso de muito treinamento e capacitação ara que todos os envolvidos no negócio entendam o que tem sido feito”, sinaliza Nakagawa.
Ele orienta que tudo o que é feito dentro da empresa nesse sentido precisa ser mensurado e transmitido aos colaboradores de forma transparente.
“É importante que se tenham indicadores de impacto social e ambiental, por exemplo, para pontuar como a empresa era e como está agora”, ensina o especialista da ESPM.
O prof. Rodrigo Leão, da Fia, indica alguns caminhos. Acompanhe:
Se está só no discurso não é Marketing de Propósito, é propaganda enganosa. Os danos podem ser mais ou menos graves conforme a marca seja acusada de Cause Washing, termo inglês usado para definir exatamente a prática de usar causas para “limpar a própria barra”.
Deixar claro para todos os stakeholders, acionistas, colabores e fornecedores, qual é o propósito do negócio e qual é o Valor Social criado pela empresa para além do lucro.
Um processo de planejamento estratégico sério deve produzir esta declaração de missão.
Uma vez feito isso, não só as ações de marketing, mas também Pesquisa e Desenvolvimento, estratégias de desenvolvimento de produtos e distribuição passam a ser afetados pelo propósito.
As ações de marketing passam, então, a se desenvolver naturalmente, com todas as ferramentas possíveis com uma mensagem que é verdadeira, poderosa e convincente.
Uma marca que tem propósito emana o emana em todos os seus pontos de contato com o mundo.
Novamente, a Natura serve de exemplo quando pesquisa um novo extrato natural para suas fragrâncias, quando desenvolve um novo tipo de embalagem mais sustentável, quando traça rotas de distribuição visando economia de carbono, quando educa suas consultoras sobre práticas sustentáveis e até na propaganda com todas as suas modernas ferramentas digitais e de experiência.
Fotos: iStock
Send this to a friend