Qual a lógica da decisão de compra do consumidor? É apenas racional, envolvendo preço e necessidade? Ou emoções, sentimentos e sensações estão altamente atreladas à conversão?
É justamente para tentar trazer respostas mais assertivas para questões como estas que a neurociência é aplicada nos negócios, envolvendo especialidades como neurociência do consumidor e neuromarketing. Neste mês em que se comemora o Dia do Consumidor, a reportagem do Portal de Notícias GS1 Brasil ouviu especialistas sobre tendências nesse assunto.
“Muitos acreditam que decisões de compra são lógicas, mas não são. Esta ação se baseia em toda uma construção feita no cérebro, associações à marca, experiências anteriores e expectativas criadas”, pontua o neurocientista e sócio da Forebrain, Billy Nascimento.
A pós-doutora em neurociência cognitiva pela Universidade de Georgetown, em Washington, fundadora e diretora do Decision Making Lab (DM.Lab), Keitiline Viacava, explica que a vertente do consumidor é derivada da neuroeconomia e busca conhecer os processos essenciais e básicos do comportamento em si, sua neurofisiologia e atividades no cérebro.
Já o neuromarketing faz parte do campo da administração e, na sua versão mais aplicada, busca resolver problemas concretos relacionados ao marketing, fazendo um uso mais estratégico da ciência e podendo, sim, estimular o consumo.
“A neurociência e o neuromarketing partem de uma base comum, que emerge de um certo consenso dos pesquisadores sobre a existência de um processamento duplo da informação comercial na mente dos consumidores”, diz Keitiline.
Esse ‘processamento duplo’ se refere às decisões que o consumidor precisa tomar dia-a-dia, a todo momento, como decidir entre comprar uma salada orgânica ou um hambúrguer para o jantar.
As pesquisas atuais indicam que essas escolhas são realizadas por dois grandes sistemas que atuam na mente e competem entre si para a tomada de decisão.
Há um sistema automático, altamente afetivo e de pouco controle (sistema 1), e outro deliberado, reflexivo e orientado a objetivos (sistema 2).
“Avaliamos as opções e fazemos escolhas planejadas quando paramos para pensar e usamos o sistema 2. Por outro lado, consumimos de modo impulsivo quando somos guiados pelo hábito ou estímulos do ambiente, neste caso, favorecendo o sistema 1. O neuromarketing procura desenvolver estratégias para influenciar essa competição na mente dos consumidores e favorecer escolhas guiadas pelo sistema 1”, esclarece Keitiline.
Por que, por vezes, o consumidor opta por um produto mais caro mesmo tendo um similar de valor menor?
Do ponto de vista da neurociência, preço é apenas um dos diferentes estímulos perceptivo-visuais processados na hora da compra. Cor, posição e tamanho do produto são outros agentes influenciadores.
“Quando o consumidor está diante de uma decisão de compra, o cérebro rastreia tudo, guiado pelo sistema de busca que envolve a liberação de dopamina (uma substância química associada a atenção, decisão e avaliação da recompensa). A seleção da atenção para elementos específicos, como o preço, dependerá da valência desse estímulo para aquele consumidor em particular, e naquele momento. Basta ver o quão rápido decidimos por um alimento rico em gorduras, açúcares ou sal quando estamos com fome, e fazemos isso muitas vezes apesar do preço”, pondera Keitiline.
A neurocientista e consultora de projetos da Nielsen, Agatha Lopes, fornece um exemplo prático.
“Imagine um consumidor que quer comprar um desodorante. Na gôndola, ele se depara com uma série de informações, como preço, estética da embalagem, frases usadas na comunicação da marca envolvendo o grau proteção daquele produto, além das características dos itens distribuídos ao lado pela concorrência, que podem ser mais ou menos engajadoras, e modelo de exposição aplicado no varejo. A neurociência alia todas essas informações para perceber o todo”, sintetiza.
Compreender a maneira como o consumidor toma decisões é fundamental para aplicar esses conceitos e ter longevidade nos negócios.
“Entender o consumidor de forma genuína, é poder entregar o que ele realmente precisa e busca, evitando superproduções”, comenta Billy Nascimento.
Outro passo importante é estar atento à experiência gerada. “O consumidor pode até ser levado pelo aroma da pipoca ao entrar na loja de conveniência e comprar sem pensar. Mas se o produto ou a experiência não forem realmente positivos, segundos depois ele usará o sistema 2 e perceberá que não valeu a pena”, adverte Keitiline, da DM.Lab.
Muitas vezes, para chegar a respostas conclusivas, a tecnologia tem sido aplicada.
“Algumas empresas fazem estudos envolvendo neurociência para checar se a comunicação escolhida para um determinado produto é efetiva. São pesquisas com consumidores recrutados de acordo com o perfil que se pretende atingir e, por meio de algumas soluções, como eletroencefalografia, reconhecimento facial e eye tracking aplicadas em um laboratório, por exemplo, alcançamos algumas respostas”, esclarece Agatha Lopes.
A gerente comercial de neurociência Nielsen, Aline Souza, mostra um exemplo prático. “Se uma determinada empresa tem uma comunicação em vídeo e quer entender a performance daquele comercial, chamamos alguns consumidores, de acordo com o target da companhia, e detectamos, com as mais diversas tecnologias, a capacidade daquele filme em ser memorável, como é fácil ou difícil de ser entendido, e tudo isso cena a cena, vendo quais delas estão ou não engajando o cliente”, conta.
Segundo Agatha, a tecnologia consegue trazer respostas para questões que, nem sempre, o consumidor é capaz de verbalizar.
As cores são utilizadas em neuromarketing por diferentes razões: ampliar características de excitabilidade, alerta, atividade e força (vermelho) ou de competência, inteligência, comunicação, confiabilidade, lógica e seriedade (azul) em torno da marca.
“Quando as cores são associadas a nomes sofisticados, parecem promover a decisão pela compra. Pesquisas sobre marketing de internet indicaram que sites que contêm interação entre tom e brilho, mantendo cores cromáticas apenas como pano de fundo (como vermelho, verde, azul), podem estimular a memória e aumentar as intenções de consumo, mas isso desde que o consumidor esteja de bom humor”, exemplifica Keitiline Viacava, da DM.Lab.
Segundo ela, as cores utilizadas em websites ou em ambientes comerciais, como shoppings, supermercados, restaurantes, bares, agências de turismo e bancos, por exemplo, parecem influenciar a percepção de tempo, relaxando (verde, azul) o consumidor ou estimulando a impaciência e a impulsividade (vermelho, amarelo).
Fotos: Getty Images
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