O impacto da pandemia no cenário econômico gera uma série de incertezas no mercado. Neste momento de cautela, todos querem saber como e quando a economia terá um fôlego. Para ajudar seus 58 mil associados nesse período tão difícil, a GS1 Brasil tem procurado compartilhar informações sobre diversos setores e visões de mercado em suas lives.
Para debater as perspectivas econômicas, a entidade promoveu o GS1 Talks com o economista-chefe do Banco BV Asset, Roberto Padovani, que falou sobre o tema “Retomada Econômica”, comentando desafios, oportunidades, cenário global, panorama político, crédito, câmbio, investimentos, entre outros.
A conversa foi conduzida por dois executivos da GS1 Brasil – o diretor de tecnologia, Roberto Matsubayashi, e o diretor de finanças e serviços corporativos, Charles Sampaio, além da participação do público que acompanhou a live.
A seguir, confira alguns insights de Roberto Padovani compartilhados durante o GS1 Talks.
O atual cenário é tão desafiador que dificulta fazer projeções econômicas até mesmo por parte do mercado financeiro.
Segundo Padovani, a instabilidade econômica pode ser vista nas projeções do Banco Central, que no dia 1° de março indicavam que a economia brasileira cresceria 2% em 2020. Em pouco tempo, em maio, a média das projeções despencaram, indicando recessão de 5,1%.
“Não temos nenhuma experiência com uma situação dessa, que tem uma característica única – uma parada profunda e sincronizada de todos os países do mundo, de todos os setores. Todo o mundo parou ao mesmo tempo. Estamos aprendendo aos poucos com as informações de mercado que estão chegando. Por exemplo, a produção de veículos no Brasil parou 98% em abril em relação ao mês anterior. Nunca tínhamos visto nada parecido”.
Para ele, as notícias da pandemia também vão ajudando a traçar possíveis cenários. “O Brasil começou bem no combate à Covid-19, mas agora estamos apanhando. As principais regiões do País estão anunciando um prolongamento do confinamento, em alguns casos são confinamentos até mais radicais. Isso faz com que maio seja um mês muito duro. A gente imaginava no começo do ano que seria abril. Agora muitos falam que vai ser pior em junho. Então, está piorando essa dinâmica de crescimento justamente por conta do período de confinamento”.
Nesse cenário, três fatores preocupam o mercado financeiro, segundo Padovani:
“Olhando para o futuro, imagino que teremos uma recuperação lenta. O choque foi profundo e a retomada está envolta de muito ruídos – sanitários, políticos, fiscais. Isso assusta o investidor, o empresário, o consumidor”, afirmou.
Na opinião do economista, apesar da retomada lenta, há alguns aspectos que podem favorecer a recuperação da economia brasileira até 2021.
Um deles é que o País é altamente dependendo do ciclo global. “Se o preço das commodities subir, seremos beneficiados. Também somos altamente dependentes do humor dos investidores. Então, apesar dos nossos erros, o contexto internacional pode nos ajudar”.
No entanto, afirmou, é necessário que o governo sinalize que o Brasil é um país sério, confiável, que possui uma agenda fiscal e não vai dar calote na dívida externa. “O mercado tem essa dúvida”.
É fundamental também o comprometimento com a retomada de reformas importantes para aumentar o crescimento e a produtividade e que estão paradas por conta da pandemia, como a lei de falências e a reforma tributária.
“Se essa agenda voltar no quarto trimestre deste ano, o Brasil será visto como um país seguro e pode se beneficiar de um cenário global favorável. O governo precisa ser mais enfático nesses aspectos”.
Apesar das tensões cada vez mais fortes entre Estados Unidos e China, que desestabilizam o cenário global, Padovani acredita que o Brasil pode extrair ganhos do comércio de commodities com a China num futuro próximo, pois a expectativa é que o gigante chinês se recupere mais rápido. O cuidado é o Brasil não se envolver nos conflitos entre as duas potências mundiais.
Apesar das dificuldades, as médias e grandes empresas estão conseguindo seguir seus negócios, pois têm operações mais sólidas. Justamente por isso, os bancos continuam alimentando o crédito para elas. Mas a realidade é bastante diferente para as organizações de menor porte, fortemente impactadas pela crise.
“O que está funcionando mal é o crédito para as pequenas empresas, porque os bancos geralmente não dão crédito para elas. A ideia do governo foi criar um programa via bancos públicos e montar um fundo junto com os grandes bancos privados para fazer o crédito chegar aos pequenos. Só que não está chegando por várias razões. Muitos micro e pequenos empresários tem tantas pendências que sequer conseguem ter acesso a recursos do Sebrae, por exemplo. A pandemia chegou num momento em que o País estava começando a sair da crise de 2016, por isso, as empresas ainda estavam muito machucadas”, explicou Padovani. “Isso é muito doloroso”.
Ele acredita que os bancos não vão conseguir atender toda a demanda de crédito. “Por isso o governo vem estudando outras formas de ajudar o micro e pequeno empresário”.
Passada a fase mais aguda da pandemia, os investimentos no País devem ser retomados. Na visão de Padovani, entre os “setores vencedores” está o de infraestrutura. As concessões nesta área devem trazer bons negócios.
Os investidores também buscam setores com ganhos mais associados às taxas de juros. Nesse sentido, construção civil e mercado imobiliário devem crescer. “À medida que estabilizar o ambiente macro e o desemprego começar a cair, o mercado imobiliário terá oportunidades. Mas isso não é agora. O mercado imobiliário deve voltar a ficar aquecido em meados de 2021”.
A desvalorização do real frente ao dólar é motivo de grande preocupação no mercado. O economista-chefe do BV Asset apontou, entre vários fatores, que as commodities, podem ajudar na taxa de câmbio. “Imaginando que em 2021 a China terá bom desempenho novamente, como o FMI projeta, as commodities devem se recuperar e ajudar o real a ficar mais forte”, explicou.
Por outro lado, os juros podem atrapalhar a taxa de câmbio. A questão é que eles sempre foram altos no Brasil, mas caíram nos últimos tempos, afastando o capital. “E o país deve continuar perdendo capital porque o Banco Central vai baixar mais os juros. Isso faz com que a moeda fique muito pressionada”, avaliou.
Na opinião de Padovani, dólar deve cair de R$ 6 para R$ 5, no médio prazo.
De qualquer forma, esse tipo de movimentação deve ocorrer apenas no último trimestre de 2020. “Vejo uma recuperação mundial, com dólar fraco, preços das commodities em alta e o Brasil reduzindo o risco percebido”, resumiu.
Segundo Padovani, hoje, não há um modelo econométrico e estatístico que ajude a projetar o Produto Interno Bruto (PIB) e outras variáveis do mercado. “Estamos sem referência nesta situação, que é totalmente nova. Isso é um desafio e tanto”.
Do ponto de vista de políticas econômicas, ele avalia que o País usa o manual da economia sem novidades, que é aumentar gasto público e dar estímulo monetário. O receio é essa situação gerar déficit primário, que poderia atingir 10% do PIB do País. “É algo gigantesco”.
“O próximo debate entre os economistas é tentar saber quais são as consequências das decisões que tomamos hoje”, afirmou Padovani, acrescentando que é preciso repensar os modelos macroeconômicos tradicionais.
“Tudo sugere que a vida não vai ser fácil nos próximos anos, com tensão geopolítica no mundo e estímulos fiscais e monetários. Não podemos ficar nenhum momento tranquilos. Administre a sua empresa pensando que é um mundo em turbulência, não estamos vivendo tempos normais. Não por causa da pandemia, mas porque a pandemia vai produzir efeitos desconhecidos no ambiente econômico”, recomendou.
Foto: Paulo Pepe
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